quinta-feira, 15 de julho de 2010
Ser Maçon é ...
Escrito por Rui Bandeira
...conciliar o egoísmo com o altruísmo...
Conceitos aparentemente opostos e impossíveis de harmonicamente se justaporem e operarem em simultâneo! No entanto, a natural e intuitiva conciliação entre estes dois opostos integra a essência da condição de maçon.
O maçon deve prosseguir o egoísmo de se aperfeiçoar a si mesmo, como objetivo principal. Não aperfeiçoar os outros, a Sociedade, a Loja ou seus Irmãos. Aperfeiçoar-se a si mesmo: este o verdadeiro e essencial objetivo do maçon. Nesse processo, o maçon descobre que uma ferramenta de inestimável valor é a sua interação com seus Irmãos, com eles e através deles aprendendo, intuindo, tateando, tenteando, reconhecendo e percorrendo o caminho do seu aperfeiçoamento pessoal, aqui largo e prazenteiro, ali rude e pedregoso, acolá estreitamente demarcado, mais adiante dificilmente reconhecível em suas fronteiras. E, egoística mas indispensavelmente, aproveita tudo o que pode - tudo o que deve! - do que seus Irmãos, a sua Loja, a sua Obediência, lhe proporcionam e que se revele útil para o pretendido aperfeiçoamento: uma ideia aqui, um pensamento acolá, uma lição deste, um conselho daquele, desejavelmente o exemplo de muitos, se não todos. Tudo, desde o mais brilhante artefato, ao simples resquício de uma sombra de um leve conhecimento, deve ser avaramente guardado, diligentemente aproveitado, oportunamente utilizado na construção a que cada um incessantemente se deve dedicar: a construção dele próprio, do seu caráter, do espírito livre e puro e capaz de evoluir, de pairar, de avançar para desconhecidos limites até para além do Ilimitado. E assim cada dia vai um pouco mais longe, é um pouco melhor, é, afinal, maçon!
Mas o maçon depressa aprende que, tal como os seus Irmãos são inestimável ferramenta para sua melhoria, assim também ele próprio é, por sua vez, não desprezável ferramenta para a demanda efetuada por cada um de seus Irmãos. Logo intui que, ao tirar, também põe, e é tirando e melhorando que cada vez mais põe para que outros também tirem, e por sua vez melhorem, e reponham, e lhe permitam de novo algo mais retirar, num infindável e frutuoso círculo virtuoso.
Nenhum maçon é maçon sozinho. Só se é plenamente maçon no confronto com seus Irmãos, dando e recebendo e todos assim aproveitando. O todo é, cada vez e cada vez mais, sempre superior à soma das partes. Esta inata cooperação, em que cada um gostosamente contribui para o Outro é condição indispensável para que cada um retire o seu salário da Arca da Loja - e cada vez retire mais e melhor salário.
Portanto, o maçon é altruísta como meio de prosseguir o seu egoísta objetivo de aperfeiçoamento e coloca o resultado em cada momento egoisticamente obtido ao altruísta dispor dos demais.
... viver a vida plenamente e não temer a morte...
Na demanda do Graal de cada maçon, rapidamente cada um se apercebe de que é bem mais do que mera acumulação de ossos e sangue e carne e vísceras, matéria fremente e animada, que um dia se gastará e quedará inanimada. Logo questiona a origem e a razão da existência da Vida e do Universo. E busca o seu significado. E encontra suas respostas, tendo presente e reconhecida a noção do Grande Arquiteto do Universo - do SEU Grande Arquiteto do Universo, seja o que reconhece da religião que pratica, seja o que entrevê através da sua própria Razão, em pessoal teologia, tão válida como qualquer religião instituída. E assim percebe o seu lugar na Vida e no Universo - e alcança a Paz. Paz consigo mesmo, Paz com o sentido da Vida, Paz com a perpétua evolução.
Cada maçon aprende - desejavelmente aprende, mais cedo ou mais tarde! - que a vida física, material, é apenas parte da Vida com V maiúsculo. Que o invólucro que é o nosso corpo, com suas dores e cansaços e doenças e envelhecimento e inexorável fim, é apenas isso, a vasilha que transporta e contém e protege o verdadeiramente valioso conteúdo que cada um de nós realmente TEM (que digo eu? É!), tantas vezes sem o saber, sem sequer o intuir. Conteúdo a que uns chamam alma, outros espírito, outros ainda outra coisa qualquer e que eu gosto de designar pela Centelha Divina que existe em cada um de nós, que é a razão de ser de cada um de nós e que sobrevive para além da materialidade de cada um de nós.
Ao compreender isto, o maçon entende que a vida física é parte do conceito mais abrangente da Vida (com V maiúsculo), como fator indispensável à evolução dessa Vida, por isso que existe, pois, se o não fosse, não teria razão para existir - seja-se criacionista, seja-se evolucionista, é território aprazivelmente neutro e comum a conceção de que o que não tem razão para existir, papel para desempenhar...não existe ou se, por erro ou acaso, existiu, extingue-se... Mas, sendo a vida física apenas parte da Vida (com V maiúsculo), é apenas um episódio, certamente importante, mas só um episódio. E, ao compreender isto, pode viver plenamente e em Paz esse episódio, aquilo a que chamamos a nossa vida, o tempo que nos é concedido entre o nascimento e a morte.
E, assim compreendendo, está em condições de não temer a morte física, que pode entender como mais uma Iniciação, uma Passagem, uma Elevação a um novo estádio da Vida (com V maiúsculo).
Uma obra do género designado por ficção científica, cujo título há muito esqueci e cujo autor também há muito olvidei, postulava que existia na vida da Humanidade um terrível segredo. Segredo que, algum dia, alguém descobriu e que era que, afinal, toda a Humanidade via o filme ao contrário: aquilo que temos por nascimento é afinal a morte, a degradação para o plano físico de algo mais puro e perfeito, e que aquilo que se tinha por morte é então o verdadeiro nascimento para o próximo passo da evolução da nossa Essência. Essa esquecida obra de esquecido autor será porventura mera e imaginosa caricatura. Mas não vemos nós que em toda a caricatura está, quiçá de modo deformado, o traço da realidade?
Ao entender que vale muito mais do que o seu invólucro material, o maçon aprende a viver plenamente a vida e a não temer a morte.
... viver a Iniciação em todos os dias da sua vida...
O maçon, quando iniciado, recebe lição, noções, princípios, afinal ferramentas que - muitas delas - não entendeu plenamente nessa ocasião. De algumas porventura nem mesmo se apercebeu então. Só mais tarde, revivendo a Iniciação, participando na Iniciação de outros, a pouco e pouco tudo vai entendendo e encaixando. E, fazendo-o, se bem refletir, verá que o que viveu , o que ouviu, o que sentiu, as lições que recebeu naquela ocasião são um guião de vida que deve ter sempre presente.
Se o maçon se comportar sempre de acordo com o que simbolicamente viveu na sua Iniciação, com o que ouviu, com as lições que aí recebeu, será efetivamente um Homem Livre e de Bons Costumes. Se viver de forma conforme com a lição da sua Iniciação, viverá bem, será útil a si próprio, aos outros e à sociedade. Nada mais precisa de fazer. Nada mais lhe é exigível.
No fundo, uma das coisas que é agradável na Maçonaria é a sua desarmante simplicidade: não são precisas grandes invenções, não são necessários etéreos princípios. Para se ser Digno, Justo e, tanto quanto humanamente possível, Perfeito, para aliar a Sabedoria à Força e à Beleza, para viver em Liberdade e em Fraternidade segundo os princípios da Igualdade, só é necessário proceder segundo o que aprendeu na Iniciação. E, chegada a hora, poderá pousar as suas ferramentas em Paz e com a noção do dever cumprido.
... conhecer e praticar os sinais , palavras e toques...
Não há que inventar! Está num texto que o Aprendiz deve conhecer e não se deve nudar o que está bem:
Um maçon é reconhecido pela sua forma de agir, sempre correta e franca (sinais); pela sua linguagem leal e sincera (palavras); por fim, pela solicitude fraterna que manifesta com todos a que se acha ligado pelos laços da solidariedade (toques).
É afinal tão simples ser maçon!
... Ser, simplesmente e verdadeiramente Ser - não Parecer!
O maçon, beneficiando da absorção, na sua personalidade, no seu caráter, na sua prática de vida, dos princípios que recolhe na Loja e na Fraternidade - afinal, dito mais simplesmente, aperfeiçoando-se - só precisa de Ser. Ser como é. Ser aquilo em que se transforma. Fazendo-o, vale a pena ser maçon, o salário está ganho, o objetivo é atingido.
No fim como no princípio, a noção-chave é a de aperfeiçoamento individual. Que se obtém pelo trabalho, pelo esforço, pela dedicação. Que se pratica. Que não se consegue parecer que se obteve!
Inútil é tentar "parecer" maçon. Tarde ou cedo - mais cedo do que mais tarde! - os que efetivamente são maçons reconhecem que quem quer "parecer" sem "ser" não é efetivamente um maçon. Quando muito, poderá ser um profano que passou por uma iniciação, mas não foi verdadeiramente iniciado. E esse pode continuar a tentar "parecer" à vontade. Nenhum verdadeiro maçon se incomodará com isso. Mas nenhum verdadeiro maçon o reconhecerá como tal, até que deixe de tentar Parecer e tente começar a Ser.
In Blog "A Partir Pedra" - texto de Rui Bandeira (09.10.2008)
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